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Sexualidade e drogas são desafios no controle da aids

Publicado: 17 de junho de 2003
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Na conferência de abertura do 1º Congresso/ Santista de Aids/DST/Hepatites, que está sendo realizado no Mendes Convention Center, com cerca de 500 participantes de várias partes do Brasil, a assessora técnica da Coordenação Nacional de DST/Aids, Denise Doneda, psicóloga especialista em dependência química, apresentou um panorama da epidemia no País. Ela citou conquistas alcançadas, especialmente na desaceleração de casos e na maior expectativa de vida dos portadores HIV. Apresentou números que revelam as políticas corretas adotadas pelo país, na prevenção e tratamento, e que deram visibilidade a segmentos atingidos pela doença que souberam, por sua vez, se organizar e exigir direitos. Mas admitiu que os desafios que o serviço público ainda enfrenta, passam pela forma de impactar a questão da sexualidade, especialmente na separação do que é público e privado, assim como o uso de drogas. Há 400 mil infectados que desconhecem sua sorologia, assinalou a técnica, lembrando que projeções da Coordenação Nacional é que surjam 21 mil casos novos da doença por ano. Justamente porque a transmissão da Aids está associada ao prazer proporcionado pelo exercício da sexualidade e ao uso de drogas. A especialista do Ministério da Saúde admitiu que, nessa área, a sociedade civil, por meio dos segmentos organizados, vem conseguindo melhores resultados do que o trabalho exercido pelo serviço público. Aumentar a oferta de preservativos distribuídos pelo governo e tornar o preço desse produto mais acessível no setor privado, a um valor máximo de R$ 0,20 a unidade, foi uma das propostas citadas no encontro pela representante do Governo Federal, lembrando que para isso seria necessário um acordo com os varejistas. Na população sexualmente ativa, o uso da camisinha, em 1999, atingia uma faixa de 24% de pessoas, crescendo para 28% em 2003. E nas relações eventuais é utilizado em 78% dos encontros. Mas há, ainda, um caminho muito longo a ser percorrido, envolvendo a adoção de hábitos mais seguros. CASOS O Brasil registra, hoje, cerca de 258 mil portadores, sem contar os milhares que não conhecem sua sorologia. E atualmente praticamente toda a população está vulnerável à doença, na medida em que, no avançar dos anos, a Aids passou a atingir desde a terceira idade aos muitos jovens e também mulheres casadas de único parceiro. A feminilização da epidemia se torna ainda mais visível na faixa mais jovem da população. A proporção de garotas infectadas, na faixa etária entre 15 a 19 anos, já é maior que a dos homens, invertendo a tendência de dois casos masculinos para um feminino, na distribuição dos casos no País, segundo a técnica do Ministério da Saúde. O congresso santista está também abrindo espaço para as críticas e propostas dos portadores e das organizações não-governamentais. Na abertura do evento, o presidente do Fórum das OGNs, Beto Volpe, assinalou a importância da discussão da inserção social, questão prioritária para os portadores que ainda são tratados como meio-cidadãos. A luta contra o preconceito e a constatação de que a Aids chegou para valer na Terceira Idade puderam ser exemplificados pela fala da fundadora da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/Aids, Maria Beatriz Dreyer Pacheco, advogada de Porto Alegre, que hoje participa de uma das mesas-redondas do evento. Ao lado do marido (que não é portador), ela vai expor a condição de uma mulher de 54 anos, mãe de família tradicional, que foi infectada sem saber, pelo primeiro marido, que também desconhecia ser portador do vírus. A descoberta da doença só ocorreu quando ela já estava no segundo casamento, e foi um choque. Temeu perder o marido com quem estava vivendo há um ano e meio. Mas ele foi solidário e a relação se solidificou na formação da RNP, onde ambos atuam. Alegre, decidida, e muito convicta da importância do enfrentamento do preconceito e do direito da sexualidade na Terceira Idade, Beatriz, de classe média alta, lamenta, no entanto, a desinformação que ainda existe. No prédio onde reside em Porto Alegre ela ainda vê pessoas saírem do elevador quando entra, ou de mães tirarem os filhos da piscina, quando vai dar um mergulho. Quero acelerar o conhecimento e torço para que as velhinhas transem até morrer, diz bem humorada. HOMENAGEM Na solenidade de abertura do evento, a médica infectologista Lair Guerra, coordenadora do Programa Nacional de DST/Aids, foi homenageada pelo trabalho pioneiro desenvolvido no país, ajudando a organizar serviços em milhares de cidades brasileiras. Ela ganhou placa da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), que organiza o congresso e foi saudada pela técnica Regina Lacerda. TERAPIA ARV Os avanços da terapia Anti-Retroviral (ARV) e os seus efeitos colaterais foram os temas abordados ontem (17), pela manhã, dentro do 1º Congresso Santista de Aids/DST/Hepatites, que está sendo realizado no Mendes Convention Center, sob o tema Reciclando Conceitos. As perspectivas clínicas e laboratoriais, a lipodistrofia, as questões hormonais e distúrbios psíquicos e HIV foram os pontos destacados por profissionais da área da Saúde. Durante as exposições, os especialistas mostraram que a moderna terapia a pacientes portadores do vírus HIV busca manter a mesma eficiência dos remédios usados hoje, porém, com menor número de comprimidos ingeridos diariamente e com a redução dos efeitos colaterais. Eles salientaram que a indústria farmacêutica já vem trabalhando nesta questão e uma série de novas drogas estão surgindo, visando a melhoria da qualidade de vida desses pacientes. De acordo com a Coordenadoria de DST/Aids, da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), um dos medicamentos que o Município vai estar adquirindo é o Tenofovir, que será usado por pacientes que já têm o vírus resistente a outros remédios. Quanto aos efeitos colaterais, que além das questões hormonais e da lipodistrofia, podem causar desvios de conduta, a SMS tem procurado interagir usando medicamentos que contrabalancem esses efeitos. Fizeram parte da mesa o médico infectologista do Hospital Albert Eisntein, Artur Timerman; o coordenador de DST/Aids/Hepatites de Santos, Ricardo Hayden; o professor do Departamento de Moléstias Infecciosas e Parasitárias da USP, Aluísio Segurado; e a secretária de Estado da Saúde do Rio de Janeiro, Vanja Maria Bessa Ferreira. PESQUISA A falta de um melhor gerenciamento técnico e de articulação do processo de trabalho são as lacunas mais preocupantes dos serviços de atendimento aos portadores HIV. Essa é uma das constatações de pesquisa realizada pela QualiAids sobre os serviços de tratamento à doença, nos anos de 2001 e 2002. O levantamento foi divulgado, ontem (17), durante a conferência proferida pela professora do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade Estadual de Londrina e pesquisadora da equipe, Regina Melchior, no 1° Congresso Santista de Aids/DST/Hepatites, que termina hoje (18). O trabalho vem contribuindo significativamente para reavaliação das falhas e acertos dos serviços de atenção a portadores do HIV, em todo o país. A pesquisa foi aplicada em todos os locais que atendem pacientes de HIV nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Pará, Maranhão, Ceará, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul. Entre os pontos positivos constatados na pesquisa, figura a alta disponibilidade de medicamentos Anti-Retrovirais (ARV) e de médicos infectologistas, ginecologistas, odontologistas, psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros e farmacêuticos nos serviços. Entretanto, foi verificada a ausência de neurologista em 10% dos serviços. Outro aspecto importante da pesquisa foi a constatação de que 93,5% dos serviços que oferecem exames de diagnóstico realizam o aconselhamento pré-teste e 96,3%, realizam o pós-teste. É oportuno lembrar que ambos procedimentos são realizados no Centro de Orientação e Aconselhamento Sorológico (Coas), de Santos, mantido pela SMS. A unidade realiza testes de HIV, sífilis e hepatites mediante preliminar orientação. Para receber o resultado o exame, a pessoa tem atendimento individual e sigiloso, feito por profissional capacitado. Já o tempo da consulta inicial, que está entre 15 e 30 minutos, segundo o estudo, é considerado pouco em relação ao esperado. O agendamento com hora marcada é outro índice baixo, apenas 20% dos serviços realizam esse procedimento. O gerenciamento técnico dos serviços apresenta baixas pontuações em vários itens. Um deles refere-se às reuniões multiprofissionais, as quais não são realizadas em 53%. Em 17% dos serviços não existe coordenação direta, 25% não registram as faltas em consultas médicas, apenas 33% registram o 1º atendimento no ano e 68% não fazem controle sistemático de óbitos. A pesquisa também verificou que os serviços especializados, localizados em municípios grandes e que atendem médio número de pacientes têm maiores chances de proporcionar melhor qualidade. Já o oposto, ou seja, os serviços não especializados, localizados em municípios pequenos e com uma demanda pequena têm maiores possibilidades de oferecer baixa qualidade. Já em relação ao tratamento Anti-Retroviral, esses primeiros resultados mostram que a adesão no Brasil é semelhante a de países desenvolvidos.