Ex-ambulante participa de prova aquática em Santos de olho no futuro

LUIGI DI VAIO

Bíceps braquial, coracobraquial, braquial e tríceps braquial. São esses os principais músculos do braço. Com eles em bom estado, pode-se ganhar o pão de cada dia. Com esforço, caixas de bala ou fardos de garrafas d'água são oferecidos nos semáforos e pedágios das principais estradas do Brasil. É a história de muitos brasileiros. E era, até pouco tempo, a de um jovem santista: Lucas Barbosa, 25 anos.

Na manhã deste domingo (22), ele usou bastante os principais músculos dos dois braços, mas em um novo capítulo de sua história, participando do 8º Campeonato Santista de Águas Abertas, na Aparecida. A prova foi organizada pela Secretaria Municipal de Esportes (Semes).

Na classificação geral, no masculino, o pódio desta disputa ficou com Gabriel Santos Galuzzi, em primeiro lugar; Daniel Rezende Fidelis, em segundo; e Ítalo Bressane da Costa, em terceiro. No feminino, Marcela Nicolau, em primeiro; Chiara Candido Paione, em segundo, e Maria Eduarda de Oliveira Rodrigues, em terceiro.

Os degraus do pódio que Lucas Barbosa (@lucas.sauro, no Instagram) escala são outros. Nas competições aquáticas, o morador do bairro Castelo, na Zona Noroeste, prefere as mais longas, especialmente as de 10 km. A de domingo, na Praia da Aparecida, foi de apenas 1.500 metros. Ele conta que um erro ao desviar de uma das boias o tirou das principais posições.

Na vida, o nadador não errou ao desviar de um futuro pouco promissor. A morte trágica de sua mãe e a depressão do pai foram os maiores obstáculos. O outro foi a fome. Chegou a chupar balas para tentar enganar o estômago. Até dois anos atrás, os braços de Lucas carregavam apenas caixas de balas e de garrafas d'água para sobreviver. Praticar natação era apenas um distante sonho.

POSTAGEM MUDOU RUMO DA VIDA

A virada se deu com a postagem no Facebook de um internauta impressionado com a educação e gentileza do ambulante, que também manifestava o gosto pela natação. Esse interesse pela modalidade chamou a atenção do nadador Claudio Miler, que hoje ele considera um pai. Claudio convidou Lucas para o que seria uma "conversa". O ambulante chegou fraco para o primeiro encontro com o nadador. Claudio o surpreendeu oferecendo sunga e óculos de natação, e eles foram para o primeiro contato com o mar.

Havia muito a ser feito para que o ambulante se transformasse em um atleta - hoje reconhecido em nível nacional, voltou recentemente de uma disputa no Rio de Janeiro. A primeira parte era cuidar da alimentação correta de Lucas, além de intensificar o treinamento. "Vi logo de cara que ele não aguentaria os treinos. Estava muito fraco", lembra Claudio.

As primeiras disputas vieram e Lucas hoje já conta com uma estrutura bem melhor. Está com o renomado treinador Márcio Latuf e recebe instruções de um nutricionista. "E foi essencial o reconhecimento da Fupes, que hoje me ajuda bastante", comemora o atleta, referindo-se à Fundação Pró-Esportes, órgão da Prefeitura de Santos, que custeia e gerencia atletas como o nadador.

SÓ COMEÇANDO

Lucas conta que os nadadores de travessias aquáticas costumam atingir a melhor performance por volta dos 35 anos. Sabe que tem um longo caminho pela frente. A realidade hoje é dividir os treinos para as principais competições com seu trabalho em uma operadora de telefonia. Gasta muita sola de tênis para pagar as contas, quando está fora d'água.

Mas com os pés no chão, o ex-ambulante não se envergonha de revelar dois sonhos: fazer a travessia do Canal da Mancha, entre Inglaterra e França, e conhecer seu ídolo no esporte: a campeã olímpica Ana Marcela Cunha. "Eu sou muito fã dela. Quero muito conhecer".

Para o primeiro sonho, promete reunir os documentos para tirar o passaporte e seguir firme nos treinos. Para o segundo, segue mandando mensagens nas redes sociais para a nadadora, que hoje também compete por Santos.

As próximas etapas do Campeonato Santista de Águas Abertas ocorrerão em 25 de setembro e 6 de novembro