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Esmeraldo Tarquínio e Quintino de Lacerda simbolizam representatividade política em Santos após escravidão

Publicado:
20 de novembro de 2022
11h 02

Ivan Belmudes

É impossível falar de representatividade na política sem citar duas importantes personalidades de Santos: Quintino de Lacerda e Esmeraldo Tarquínio. Ambos, em suas épocas, foram eleitos com grande quantidade de votos e apoio popular, perseguidos politicamente e entraram para a história da Cidade como representantes da luta do povo negro pelo protagonismo político.

Quintino de Lacerda foi o grande líder do Quilombo do Jabaquara e figura marcante na luta negra pela liberdade em Santos, mas mesmo após a abolição da escravidão se manteve como uma figura muito importante para a política santista, sendo eleito vereador (em 1895) e o primeiro negro a presidir o legislativo santista.

Mas isso não aconteceu sem luta, pelo contrário, era difícil para a elite branca e conservadora, que liderava a Câmara da Cidade, aceitar que um líder quilombola e ex-escravizado assumisse uma cadeira como vereador.

LUTA JUDICIAL CONTRA O RACISMO

Apesar de eleito como o terceiro candidato mais votado, Quintino de Lacerda corria o risco de não assumir o cargo, devido principalmente ao racismo. Lacerda recorreu à Justiça e, graças a um Acórdão do Tribunal de São Paulo, tomou posse como vereador em 9 de julho de 1895.

O curioso é que foi justamente o racismo da elite política da época que fez de Quintino de Lacerda o primeiro presidente negro da história da Câmara Municipal de Santos, pois sua posse gerou a renúncia do presidente da casa, Manoel Mario Tourinho, que foi seguida pelo vereador Alberto Veiga.

Se declarando “enojado”, o presidente da Casa José André do Sacramento Macuco teve que dar posse para Quintino, mas também renunciou. A onda de renúncias fez com que o legislativo santista ficasse fechado alguns dias para poder empossar os cargos que ficaram vagos. O curioso é que, devido às renúncias, foi justamente Quintino de Lacerda que se tornou o presidente da casa.

Apesar dessa resistência de parte da elite política quanto à eleição de Lacerda, o historiador da Fundação Arquivo e Memória de Santos (Fams) Dionísio de Almeida explica que a expressiva votação dele refletiu o pensamento progressista que era maioria na Cidade.

“A eleição de Quintino de Lacerda como vereador para a Câmara de Santos mostra a importância deste movimento e da liderança dele, que era muito popular na época”, diz. Lacerda se manteve no cargo até o final do mandato em 1896. O herói santista morreu em 10 de agosto de 1898, vítima de um ataque cardíaco.

ESMERALDO TARQUÍNIO

Esmeraldo Tarquínio foi vereador (eleito em 1959) e deputado estadual (em dois mandatos, sendo o primeiro em 1962), além de advogado, despachante aduaneiro e jornalista. Foi eleito prefeito de Santos em 1968 com cerca de 45 mil votos. Devido à Ditadura Militar instaurada no País, teve o mandato cassado antes mesmo da posse e não pode jamais assumir o cargo.

Segundo o filho dele, Esmeraldo Tarquínio Neto, que chegou a ser vice-prefeito de Santos (1984/1988), a cassação do pai se deu por dois fatores determinantes: o fato de ser um homem negro e por ser uma liderança popular.

“O fator racial teve um caráter fundamental, pois as pessoas não estavam preparadas para viver a diversidade, mas outro fator fundamental para a cassação, tão importante quanto, era o fato de ter sido uma liderança popular, que tinha projetos modernos de desenvolvimento social e econômico para a Cidade”.

Mesmo após perder o cargo para o qual foi democraticamente eleito, Tarquínio nunca deixou de lado o ativismo político, tendo a causa social e a luta pela autonomia de Santos como as suas principais bandeiras. Seus direitos políticos foram restabelecidos em 1979. No mesmo ano, foi o primeiro a assinar um abaixo assinado em prol da devolução da autonomia política da Cidade.

Em 1982, Tarquínio participou ativamente da campanha de Franco Montoro para o Governo do Estado de São Paulo, mas, infelizmente, não pôde ver a vitória do candidato, falecendo poucos dias antes da votação (10 de novembro de 1982), aos 55 anos, vítima de um acidente vascular cerebral.

Cerca de dois anos após sua morte, Oswaldo Justo foi eleito prefeito de Santos com o filho de Tarquínio, Esmeraldo Neto, na condição de vice. Ele relembra com carinho a trajetória política do pai, um dos maiores símbolos da luta santista pela democracia. “Meu pai foi a maior liderança de origem e atuação popular que a Cidade teve. Ele tinha Santos e a política na pele, sentia a necessidade da troca de energia, vivia isso e para isso”.

REPARAÇÃO HISTÓRICA

Quase 50 anos após ter o cargo cassado pela Ditadura Militar foi sancionada, em 2017, pelo então prefeito de Santos Paulo Alexandre Barbosa, a lei que confere a Tarquínio a condição de prefeito municipal.

A cerimônia foi realizada no salão nobre do Paço Municipal, que leva o seu nome. De acordo com o texto da lei 3.373/2017, Tarquínio terá que ser tratado como ex-prefeito em todos os objetos e cerimônias oficiais do Município em que for mencionado.

Fotos: Arquivo pessoal/Arquivo PMS.

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Tarquínio foi vereador e deputado estadual.
Quintino de Lacerda foi o grande líder do Quilombo do Jabaquara.