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110 anos do Santos FC: História se entrelaça com a de tradicional cafeteria da Cidade

Publicado: 14 de abril de 2022 - 12h25

Ivan Belmudes

Numa tarde de domingo, em 14 de abril de 1912, há exatos 110 anos, na sede do antigo Clube Concórdia, onde hoje fica a Rua João Pessoa, 8/10 (antiga Rua do Rosário, 18), no Centro de Santos, a iniciativa de três grandes esportistas mudaria para sempre a história da Cidade e do futebol mundial.

Sede do antigo Clube Concórdia, no Centro, onde nasceu o Santos, e atual sede do clube, onde fica o Estádio Urbano Caldeira, na Vila Belmiro

Naquele encontro, Francisco Raymundo Marques, Mário Ferraz de Campos e Argemiro de Souza Júnior convidaram todos os interessados na Cidade para fundar um clube de futebol, esporte que começava a ganhar força no País. Surgia o Santos Futebol Clube e, a partir de então, começaria uma história improvável de sucesso e glórias, que encantou o planeta, ganhou títulos, revelou um Rei e muitos meninos. 

Dois dias antes, em 12 de abril de 1912, a apenas 350 metros de distância (Rua Gonçalves Dias, 34) começava a história da mais antiga cafeteria de Santos ainda em atividade, o Rei do Café. Mas as coincidências não param por aí. As histórias desse tradicional comércio do Centro Histórico e do time que encantou gerações possuem muitas coincidências que parecem até roteiro de filme.

Rei do Café é a cafeteria mais antiga em funcionamento na Cidade
 

SANTOS E CAFÉ NO AUGE

Joaquim Rema Alves, 78 anos, lembra bem de ver o pai, o português Joaquim Augusto Alves, trabalhar incansavelmente no Rei do Café. Ele nasceu justamente num momento de fartura do produto e virou sócio do Santos em 1955 (próximo de completar 12 anos). “Meu pai tratou logo de me associar ao Santos Futebol Clube, pois na sua visão seus filhos deveriam ser santistas de coração, pois nascemos e vivemos aqui”.

E seu Joaquim Rema deu sorte ao Santos. No mesmo ano em que virou sócio do clube, o time sagrou-se campeão paulista de futebol, depois de 20 anos de espera e diversos vice-campeonatos. Apenas um ano depois, o já poderoso esquadrão ganharia a companhia do maior jogador de todos os tempos, o Rei Pelé.

As alegrias dos títulos coincidiram com um momento mágico da economia brasileira e, consequentemente, do café e comércio da família Alves. Eram os anos dourados do Brasil, com otimismo em todas as áreas, inclusive no esporte. O Santos era uma verdadeira "seleção", que fazia sucesso em todo o mundo, empilhava taças, parava guerras, acumulava feitos históricos, mas sempre mantendo as raízes fortes com a Cidade e seus moradores.

Boa fase do Santos e do café coincidiram em diversos momentos

LIGAÇÕES

O momento era grandioso, mas existia uma certa informalidade e inocência, quase poética, em mais uma forte ligação entre a família e o Peixe. O maior time de todos os tempos tinha seus treinos acompanhados de perto por meninos santistas, entre eles o pequeno José Reinaldo, irmão de Joaquim, e atual proprietário da tradicional cafeteria.

A família Alves era vizinha de Nicolau Moran, um dos maiores meias da história do Santos e dirigente no período de ouro do time. José Reinaldo, 67 anos, era amigo dos filhos do dirigente e, por conta disso, frequentava os gramados da Vila Belmiro antes e durante o treino dos jogadores do alvinegro.

Ele se recorda com carinho desses momentos. “Dividíamos o campo em quatro e ficávamos brincando. Pouco tempo depois chegavam o Pelé, Dorval, Pepe, Mengálvio... Nessa hora nos deitávamos no canto do gramado e víamos aqueles grandes jogadores treinarem. Aquele time que encantou o mundo”.

José Reinaldo, proprietário do Rei do Café, em 2016, e ao lado, o local onde ele ficava com a garotada assistindo os treinos do goleiro do Santos

Na foto é possível ver as crianças, que assim como seu José relata, ficavam no campo de jogo, curtindo o treinamento do goleiro Laércio.

E se na infância as crianças costumam ver o mundo de maneira mais grandiosa do que é, esse não era o caso destas. O time realmente estava acima de qualquer outro no planeta, conquistando tudo o que podia. Nas décadas de 50 e 60 foram 11 Campeonatos Paulistas, quatro taças do Rio-São Paulo, seis campeonatos brasileiros, duas Libertadores, dois Mundiais, além de uma Recopa Sul-Americana e uma Recopa Mundial. Isso sem contar as viagens pelo mundo elevando o nome do Brasil, de Santos e até mesmo do café.

CRISE

As histórias do Rei do Café e do Santos parecem realmente caminhar juntas. Nos anos 70 e 80 os títulos do Santos se tornaram mais raros, era outro período do Brasil, o café também passava por algumas crises.
Na década de 80 e 90 nasceram os irmãos Guilherme Mauri Alves e Victor Mauri Alves, que administram atualmente o estabelecimento. Ambos herdaram os dois amores da família, pelo Santos e pelo café. Victor conta que, no momento mais difícil do time, na década de 90, o comércio da família também não estava bem.

Filhos, que administram atualmente o comércio, amam o Peixe e o café, assim como o pai. 

“Foram anos em que a economia foi muito mal, a cafeteria passava por dificuldades, nada parecia dar certo e o futuro não era nada promissor”, diz.

REDENÇÃO

Curiosamente, no início dos anos 2000, o comércio do café começou a melhorar e foi justamente nessa época, para ser mais preciso, em 2002, que o Santos ressurgiu das cinzas com o título redentor para qualquer jovem que viveu a angústia dos anos de "jejum".

“Me lembro até hoje, a final, as pedaladas, o fato de o jogo ser justamente contra o Corinthians, nosso maior rival, não tem como esquecer”, conta Victor, visivelmente emocionado, citando os nomes de todos os jogadores daquela equipe.

Aos 28 anos, Guilherme tem no time de 2010 as melhores lembranças. Mas se recorda com carinho de 2002, quando ainda era uma criança e ficou impressionado com a comemoração. “Era uma festa impressionante, muitos fogos, meus tios em casa, uma comemoração incrível. Depois não parei mais, sou fanático, guardo até mesmo os ingressos de todos os jogos que fui”.

Victor e Guilherme encararam momentos difíceis do Peixe e do café, mas também celebraram momentos e conquistas inesquecíveis

GERAÇÕES DE AMOR PELO SANTOS

Para quem não gosta de futebol, todas essas ligações entre o que aconteceu no campo e no comércio da família podem parecer sem sentido ou coincidência. Mas como há tempos ensinou o lendário técnico italiano Arrigo Sacchi: "O futebol é a coisa mais importante dentre as coisas menos importantes". E não é incomum você ouvir um fanático santista ver sua vida se confundir com a história do alvinegro.

Isso porque o futebol é passional e a racionalidade fica em segundo plano diante do amor, que no caso da família Alves é branco... e preto (como uma boa xícara de café). 110 anos se passaram para o Santos e para o Rei do Café, com três gerações de santistas, como Joaquim Augusto, português que adotou o time para si, os irmãos Joaquim e José Reinaldo (ilustre espectador dos treinos do Santos) e Victor e Guilherme, que acompanharam de perto a retomada das glórias.

Família Alves: gerações apaixonadas pelo Santos e pelo café

A esperança de todos é de que os próximos anos sejam tão gloriosos quanto os anteriores, para a alegria da quarta geração, que já está a caminho. Bernardo, filho de Guilherme, ainda nem nasceu, mas já ostenta "o orgulho que nem todos podem ter".

 

Fotos: Carlos Nogueira / PMS, Arquivo Pessoal, Divulgação - Santos F.C e acervo do cartofilista Laire José Giraud (Foto histórica do Centro de Santos)