Renomado artista urbano finaliza painéis gigantes em Santos

A retirada da tela de proteção que cobria há 45 dias a parede lateral do futuro Centro de Atividades Turísticas de Santos, no bairro Ponta da Praia, revelou uma exposição de arte a céu aberto, com riquíssimos detalhes, perspectivas em 3D e muito valor afetivo aos santistas.

Ali, quem passa, bem ao lado do Mercado de Peixes (Av. Gov. Mário Covas Junior, 3050), já pode contemplar um grande mural de arte urbana, de 800 metros quadrados, composto por quatro painéis que retratam a realidade da Cidade sob a ótica do artista urbano Eduardo Kobra.

O muralista, que começou nos anos 1987 pintando nas ruas e já somou mais de 3 mil artes em cerca de 40 países, realizou uma densa pesquisa para chegar à escolha das quatro cenas: a Bolsa do Café, o bonde turístico, o Pelé e o trabalho no Porto.

As imagens foram escolhidas a dedo pelo artista. “Para chegar nesse resultado, foram feitos 30 desenhos diferentes em menor escala. Fiz uma pesquisa histórica, iconográfica e visitei locais da Cidade já pensando na parede disponível. Busquei um significado em cada uma delas, principalmente valorizando a cultura e a história de Santos”.

Além dos temas escolhidos, Kobra foi detalhista também em valorizar as pessoas. Na imagem do Porto, destacou o trabalhador portuário. “Aqui temos uma homenagem aos milhares de profissionais que ali trabalham e movimentam não só a Cidade de Santos, mas o Brasil inteiro em um dos maiores portos do Mundo”.

Em outra cena, detalhes para os bondes. “Achei uma conexão com meu trabalho, as memórias que tenho, arquiteturas, paisagens, cenas antigas. E o fato dos bondes circularem até hoje, aqui em Santos, isso é muito interessante”.

O artista também citou a inspiração no painel da Bolsa do Café. “Esse é um prédio sensacional, excepcional, a quantidade de detalhes, por dentro e por fora é lindíssimo. Quando prestei atenção nos detalhes, quis valorizar a porta de entrada, as colunas principais, as esculturas que ficam no topo. Avaliei centenas e centenas de imagens, para chegar nesta que estamos vendo”.

E sobre a escolha de Pelé, Kobra comentou o prazer em retratar um dos maiores craques de todos os tempos. “Pelé faz 80 anos e esta é uma homenagem para ele. Essa imagem já é uma obra de arte, é uma foto do Paulo Machado, intitulada ‘coração do rei’ e eu tive a licença poética de inserir a palavra ‘Santos’, pelo amor pela Cidade de Santos tem pelo Pelé e pelo amor que o Pelé tem por Santos. Pelé é essa referência de talento, genialidade, espontaneidade e em todos os lugares do Mundo em que tenho passado, e foram já os cinco continentes, o Brasil é sempre lembrado através do Pelé, que até hoje segue inspirando gerações e gerações”.

O PAINEL

As quatro obras são conectadas pelas muretas, que serve como uma moldura para cada uma das ilustrações e se integram em uma borda mais grossa, exatamente como acontece nas praias e canais. Para executar a obra gigante, Kobra contou com auxílio de mais quatro artistas, trabalhando durante 45 dias, diariamente, das 8h às 18h.

Foram utilizadas entre 300 e 500 latas de spray, além de tinta esmalte sintético, látex acrílico, compressores, todos empregados em várias técnicas misturadas para chegar ao resultado final. “O mural foi feito com a técnica de quadriculado. Primeiro o muro estava branco, depois quadriculamos o espaço todo, e então passamos a fazer os desenhos”.  

ENCONTRO ESPECIAL

Na manhã quente de sábado, dia em que as telas que encobriam os painéis foram retiradas, Kobra também foi presenteado com a presença de alguém especial. O condutor do bonde retratado em detalhes por ele, Welcio Francilino da Costa, foi ao local para ver sua ilustração. “É um momento especial para mim, espero que ele tenha gostado do desenho que fiz”, comentou o artista, após cumprimentar o profissional, que estava adornado com seu traje profissional, após deixar por alguns minutos seu expediente no Museu Pelé, local onde trabalha atualmente.

Emocionado, Wélcio disse que não fazia ideia que estava retratado em uma arte tão grande. “Vieram me buscar no museu, não sabia o que estava acontecendo. O artista caprichou, me fez mais bonito que sou. Me sinto maravilhado, o coração bateu forte quando me vi ali, ao lado do Pelé. Nem imaginava que iria ganhar este presente de aniversário”, comentou Wélcio, que completou 45 anos no último dia 26 de setembro.

Ele se lembra do momento em que a cena original foi registrada pelo fotógrafo. “Acho que essa foto foi tirada em 2002, pelo que me lembro. Todos já tinham embarcado, pagado suas viagens, e eu saí rapidinho para o fotógrafo registrar. Fiquei envergonhado no dia”. Londrinense, o servidor da CET Santos trabalha na Cidade há 26 anos, local onde constituiu família e se tornou pai. “Santos mora no meu coração, uma Cidade acolhedora. Sou apaixonado pelos bondes, ninguém pode falar mal deles perto de mim, são meu xodó”.      

PARA TODOS

Para Eduardo Kobra, foi especial poder criar uma arte urbana em Santos. “É um privilégio poder ocupar um espaço público com meu trabalho. Minha arte é uma forma democrática de expor o trabalho e eu penso nas ruas como uma verdadeira galeria de arte a céu aberto. Temos pessoas mais simples, outras pessoas que têm acesso a museu, viajaram o mundo todo, outras não. Na rua, a arte é para todos. Eu tenho uma ligação com Santos, vinha para cá quando bebê, meus avós tinham apartamento na Cidade. Ter esse mural retratado, aqui em Santos, é uma honra e um privilégio para mim”.  

E o artista deixa uma mensagem de esperança, para o momento de pandemia e tantas incertezas entre os povos do mundo. “Comecei a pintar nas ruas. Tudo o que sou, tudo o que aprendi, foi na rua. Então, vale muito a pena esse contato com as pessoas, expor na rua, ver o rosto das pessoas ao visualizar as obras. Ainda mais nesse momento delicado que a gente está passando, as pessoas estão tristes, estão nervosas. Poder trazer de certa forma um mural como este, com cor, com vida, mostrar para as pessoas que, mesmo em meio ao que estamos passando, tenham fé em Deus que tudo vai mudar e melhorar. É uma forma de trazer esperança de que dias melhores virão”.