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Homem espera recomeço após acolhimento. Assista a vídeo sobre a abordagem social

Publicado: 14 de novembro de 2018
17h 48

LEANDRO ORDONEZ

Mário é o nome fictício do homem que, até a noite da última terça-feira (13), perambulava a passos tímidos pelas ruas da Vila Mathias, com sapatos mal calçados, cerca de dois números acima do ideal. A pele parda era coberta por uma camiseta já esgarçada e uma bermuda repleta de dobras na cintura, ambas peças encardidas. A face manchada pela sujeira em meio à barba crescida e o cabelo em retalhos que expunham partes do couro cabeludo completavam o aspecto de abandono pessoal.

Consigo, ele trazia apenas pedaços de pano contidos numa sacola plástica da qual largou somente para levar as mãos ao abdômen assim que avistou os quatro integrantes da equipe de abordagem da Secretaria de Desenvolvimento Social (Seds) que acabavam de descer da viatura de ronda noturna. Queixando-se de dores, ajoelhou-se na calçada para, com voz fraca e ar cansado, relatar o próprio drama.

A história de Mário em Santos teve início em 2016, aos 26 anos, após longa viagem em boleias de caminhão desde Adustina, município de 16 mil habitantes do interior da Bahia, onde vivia com os pais. “Sou filho de Pedro mais Dulce”, conta, dizendo que deixou a terra natal “pelo motivo de conseguir emprego”. Até então, havia trabalhado somente no campo, em plantações.

A aventura em solo santista começou bem, segundo ele, recordando do primeiro contato que teve com o mar. “Gostei demais da praia quando vi. É a coisa mais linda do mundo junto com o sol da manhã”. No entanto, os meses seguintes foram de desilusão e penúria. Sem casa nem emprego, abrigou-se na calçada da Igreja do Embaré, onde passou noites ao relento por dois invernos, em situação eventualmente amenizada pela solidariedade. “Ia dormir com frio e acordava sentindo uma sensação gostosa porque me cobriam durante a madrugada. As pessoas me ajudaram muito”.

Mas o drama se agravaria. Tornou-se dependente do crack, “embora muitas vezes não pudesse pagar”. Em condição de vida degradante, contraiu doenças que o levaram a uma internação. E foi nesse período que teve o último contato com o pai. “Ele veio me ver porque eu estava no hospital, com muita dor na barriga e vomitando uns bichos bem feios”, relembra. A presença paterna, contudo, foi breve. Ao ser perguntado sobre o assunto, ele mareja os olhos, baixa a cabeça e desconversa. Fala sobre futebol, da paixão pelo Santos FC e do sonho de conhecer o Museu Pelé.

 

ATENDIMENTO

Acolhido pela equipe do programa Novo Olhar, da Seds, Mário foi encaminhado à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Central, onde foi novamente diagnosticado com problemas estomacais. Medicado e portando receita médica – vai retirar o remédio numa policlínica –, retornou ao veículo da secretaria para ingressar na Seção de Acolhimento e Abrigo Provisório de Adultos, Idosos e Famílias em Situação de Rua (Seacolhe-AIF), onde passou a noite.

Além dos cuidados com a saúde, ele receberá auxílio para obter novos documentos, já que chegou ao local sem qualquer identificação oficial. Também terá a oportunidade de contatar a família e regressar à cidade natal se assim desejar.

Na manhã desta quarta-feira (14), visivelmente melhor, Mário recebeu a equipe da Secretaria de Comunicação (Secom) com sorrisos e ofereceu a todos um pouco do café disponível na sala de refeições. De banho tomado, cabelo devidamente cortado “por um moço que tem a mão muito boa” e com um cavanhaque milimetricamente aparado, sentou-se para conversar e dizer que planeja um recomeço, “algo que faça lembrar história de filme”.

 

Foto: Rogério Bomfim

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