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Há 100 anos, funcionava o primeiro bonde elétrico em santos

Publicado: 24 de abril de 2009
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No dia 28 de abril de 1909, por volta das 11h, ao ritmo da Banda de Música Municipal, Santos assistia à viagem inaugural dos bondes eletrificados. Seis veículos transportaram autoridades políticas e convidados, alguns ilustres como o pintor Benedicto Calixto e o sanitarista Saturnino de Brito, partindo da Rua de São Leopoldo, no Centro Histórico, até São Vicente, via praia. O percurso, concluído em 48 minutos, colocava o município em sintonia com o que havia de mais moderno em transporte coletivo no mundo. Mas, a história do bonde em Santos começou em 1871, quando entrou em operação a primeira linha puxada por burros, que fazia o trajeto do Centro até a praia do Boqueirão, um ano antes de um bonde circular na capital do Estado. A modernização veio a partir de 1904, quando o sistema foi absorvido pela The City of Santos Improvements Company, também responsável pelos serviços de luz, força e gás na cidade. De acordo com Waldir Rueda, historiador que pesquisa sobre os bondes de Santos, em fevereiro de 1909 a empresa começou a comprar materiais e veículos apropriados para o sistema elétrico, iniciando no mesmo mês a colocação de trilhos na Avenida Ana Costa. Segundo ele, apesar de a inauguração oficial do bonde elétrico ter ocorrido em 28 de abril, uma viagem de teste foi realizada no início do mesmo mês, tendo a bordo diretores da companhia e familiares. LEMBRANÇAS A escritora Edith Pires Gonçalves Dias, 89 anos, guarda boas lembranças da época em que o bonde era a principal opção de transporte público. Ela subiu pela primeira vez num bonde aos três anos de idade, quando o sistema elétrico já predominava, mas conta que chegou a ver veículos puxados por animais no final da década de 20, usados para transporte de produtos. "Apesar de abertos, os bondes eram muito limpos. Os funcionários eram maravilhosos e o motorneiro sempre esperava aquelas pessoas que vinham correndo para tomar a passagem". E recorda de bondes que marcaram época, como o de número 13, espécie de linha turística que interligava a Ponta da Praia ao José Menino, onde costumava passear aos finais de semana com seu marido e filhos. Secundino Duarte Perez, 70 anos, viveu o outro lado dessa realidade, foi condutor (espécie de cobrador) e fiscal de bonde no SMTC (Serviço Municipal de Transporte Coletivo) por dez anos. O trabalho, segundo ele, era muito cansativo e exigia agilidade e astúcia, para evitar que os passageiros desembarcassem sem pagar. Mesmo com a rotina intensa, para ele havia compensações, como a confiança e a amizade de muitos usuários. "Eu tenho o bonde no sangue desde o primeiro dia de trabalho. É uma felicidade que carrego até hoje, tanto que meu filho e neto gostam de tudo que é relacionado a bonde". RESGATANDO O PASSADO As dificuldades para manutenção dos veículos e as facilidades do transporte a diesel resultaram na finalização do transporte de bonde na cidade em 28 de fevereiro de 1971. A reativação ocorreria somente quase 30 anos depois, em 23 de setembro de 2000, quando a prefeitura inaugurou a linha turística do Centro Histórico, com 1,7 km, por onde circulou o bonde escocês de prefixo 32. Em seguida, mais um escocês foi recuperado, assim como um reboque. Desde então, o passeio de 15 minutos, que tem acompanhamento de guia de turismo e contempla importantes pontos históricos da cidade, já recebeu 830 mil passageiros. Além de permitir uma viagem ao passado, o bonde também se transformou no ícone da revitalização da região central da cidade, que ganhou impulso com o programa Alegra Centro. Na época da reativação do bonde, o comerciante Amadeu Lopes Louzada era o presidente da CDL-Santos (Câmara de Dirigentes Lojistas). Ele se recorda das críticas de alguns comerciantes devido às obras, que afastaram os clientes temporariamente. "Passou o tempo e o bonde começou a trazer turistas para o Centro, melhorando o movimento na região". Hoje, Louzada aguarda com expectativa a ampliação da linha turística: "Com certeza vai alavancar o turismo e o comércio em geral". O Bonde Turístico é hoje o atrativo mais procurado no Centro Histórico e o terceiro da cidade. Foi ele também que inspirou a Marca Institucional de Turismo em Santos - definida em concurso nacional. Também faz sucesso no Carnaval com o Carnabonde, é utilizado como cenário de gravações de cinema e televisão e ganhou um dia específico no calendário oficial do município (23 de setembro). O passeio pode ser realizado de terça a domingo, feriados e pontos facultativos, das 11h às 17h. O bilhete custa R$ 1,00, sendo gratuito para menores de cinco anos e maiores de 65 anos. RECONSTRUINDO BONDES Para que tudo isso se tornasse realidade, foi necessária grande perícia por parte dos técnicos da prefeitura e da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) para a recuperação de sistemas originais de funcionamento dos antigos veículos. A implementação do serviço representou um desafio técnico e as informações elétricas e mecânicas necessárias foram fornecidas pela CTC (Companhia de Transportes Coletivos) do Rio de Janeiro, auxiliada pela Fams (Fundação Arquivo e Memória de Santos) na recuperação de documentos, fotos e plantas. "O início foi frustrante, fazíamos testes de madrugada e muitas vezes não conseguíamos resultado. Quando o bonde funcionou pela primeira vez foi uma alegria geral", conta o engenheiro elétrico Marcos Rogério Nascimento. Uma equipe altamente especializada atua na CET, que traz experiências acumuladas do serviço de bondes e de ônibus da antiga CSTC (Companhia Santista de Transportes Coletivos). "É gratificante ver o estado em que chegam os veículos aqui e, depois do nosso trabalho, vê-los funcionando como carros 0km", destaca o coordenador da equipe, Sérgio Pini. MUSEU VIVO O sucesso da Linha Turística levou a prefeitura a buscar mais bondes. Após contatos com outras cidades do mundo, recebeu em doação três veículos portugueses, vindos do Porto; e dois italianos, de Turim - sendo que um destes é articulado e funcionará como restaurante sobre trilhos. Destes, dois portugueses já foram restaurados e circulam pelo trajeto do Centro Histórico, ao lado dos dois escoceses e do reboque. Com apoio de um grupo de empresas locais, que providenciaram todo o transporte e desembaraço aduaneiro, o município não teve custos com a vinda dos cinco veículos europeus. Santos conquistou ainda mais dois bondes de fabricação americana - um doado pelo Sesc de Bertioga e outro pela empresa Votorantim. Assim, o acervo do Museu Vivo de Bondes da cidade passou em quatro anos de três para dez exemplares, incluindo-se o exemplar fixado na Praça das Bandeiras, que funciona como posto de informações turísticas, no Gonzaga. Paralelamente, a prefeitura está ampliando a Linha Turística, que passará dos atuais 1,7 km para 5 km, contemplando 40 pontos de interesse histórico, artístico e cultural. Na próxima terça-feira (28), será entregue o primeiro trecho dessa ampliação, com 1,2 km, que aumentará o percurso inicialmente para 2,9 km. Todas as ruas que receberam os trilhos também foram contempladas com obras de repavimentação, revitalização das calçadas, realinhamento das vias, transferência de postes e sinalização. Esta primeira parte do novo anel viário, que será interligado com o atual trajeto, é formado pelas praças Barão do Rio Branco e da República e ruas Visconde do Rio Branco, Constituição, General Câmara e Augusto Severo (atrás do Paço Municipal), ligando a Praça Mauá ao Outeiro de Santa Catarina. PRESERVAÇÃO HISTÓRICA Durante as escavações no Centro Histórico para a obra de ampliação da linha, já foram encontrados mais de 4 mil peças históricas por meio do processo de arqueologia preventiva, coordenado pelo arqueólogo Manoel Gonzalez, em parceria com a prefeitura. Entre os resultados, objetos como faianças (louças) portuguesas e inglesas, garrafas artesanais, pedaços de azulejos, pratos e xícaras, ferraduras, ossadas humanas e de animais, datados de 1600 a 1900. Também foram localizados quatro sítios arqueológicos importantes: o local do segundo prédio da Santa Casa de Misericórdia (Praça Mauá), o cemitério da Igreja do Rosário dos Homens Pretos (Rua Vasconcelos Tavares), a primeira cadeia da Vila de Santos (Praça da República) e o antigo cemitério da Igreja do Carmo (Praça Barão do Rio Branco). "Se não fosse esse trabalho, tudo isso seria perdido e deixaria de se contar a arqueologia da cidade num período de 300 anos de transição", destaca Gonzalez. PROGRAMAÇÃO CELEBRA CENTENÁRIO A prefeitura promoverá a partir da próxima terça-feira (28), uma ampla programação de comemoração do centenário do bonde elétrico na cidade. Neste dia haverá a distribuição à população de cartões postais, fôlderes e dobraduras sobre o tema e, das 12h às 17h, o passeio da Linha Turística do bonde será gratuito. A partir das 10h, a Estação do Valongo (Largo Marquês de Monte Alegre, Centro Histórico) será palco de uma homenagem a ex-funcionários, exposição fotográfica, apresentação de chorinho e da partida dos quatro bondes e reboque ao Outeiro de Santa Catarina. Na oportunidade, será entregue o primeiro trecho de ampliação da linha, de 1,2km. Com isso, o percurso passa a ter 2,9 km. A meta da prefeitura é atingir 5 km. No mesmo dia e horário, cerca de 150 alunos integrantes das bandas da Seduc (Secretaria de Educação) se apresentarão na Praça Mauá, onde haverá distribuição de bolas de gás com selo comemorativo. Às 12h, no mesmo local, está prevista a chegada dos bondes e a apresentação da Banda Carlos Gomes. Já às 14h, na Associação Comercial de Santos (Rua XV de Novembro, 137), haverá a abertura do círculo de palestras com o presidente da CET-Santos, Rogério Crantschaninov, seguido da apresentação Bonde elétrico: um resgate do Centro Histórico, por Luiz Guimarães, e O bonde elétrico em Santos, com Waldemar Stiel. Às 17h, na Casa de Frontaria Azulejada (Rua do Comércio, 96), será lançado o livro Bondes de Santos, de Sérgio Willians. Entre as 11h e as 17h, o público poderá conferir, na Estação do Valongo, a exposição de painéis fotográficos da Fams e acervo do Museu dos Transportes. Na quarta-feira (29), às 14h, na Associação Comercial, serão realizadas as palestras Um bonde chamado Saudade, por Miguel Escandon, e Bondes de Santos: 138 anos de histórias, com Sérgio Willians. E na quinta-feira (30), no mesmo horário, será a vez da palestra Museu vivo do bonde e seu acervo, por Marcos Rogério Nascimento. Do dia 28 até 30 deste mês, os munícipes também poderão conhecer o processo de restauração dos veículos, em visitas monitoradas à CET (Av. Rangel Pestana, 100, Vila Mathias). A programação conta com o apoio do Instituto Histórico e Geográfico de Santos. LINHA DO TEMPO 1871 – Em 9 de outubro, a primeira linha de bonde, puxada por burros, entra em operação na cidade, fazendo o trajeto do Centro à praia do Boqueirão, um ano antes de o bonde circular na capital do Estado. 1909 – Em 28 de abril é inaugurado o serviço eletrificado de bonde na cidade. A primeira linha a trafegar em Santos foi a nº 2, que ligava o Centro a São Vicente pela praia, passando pela Vila Mathias, Avenida Ana Costa, orla, com ponto final na praça Barão do Rio Branco, em São Vicente. 1971 – No dia 28 de fevereiro, o bonde de prefixo 258, da linha 42, fez a última viagem e foi recolhido à garagem. Era o fim do transporte por bonde na cidade. 1984 – Primeira experiência de Linha Turística na orla, que funcionou até o ano seguinte. 2000 – No dia 23 de setembro, a prefeitura inaugura uma Linha Turística no Centro Histórico, com o bonde escocês de prefixo 32. Em outubro, o veículo ganhou um reboque originário da época em que os bondes eram puxados por burros. 2002 – Bonde fechado (camarão), prefixo 40, começa a circular na linha, em 26 de janeiro. 2005 – Em 19 de setembro, desembarcam no nosso porto três bondes portugueses, doados a Santos pela cidade do Porto. 2006- Entra em circulação o primeiro bonde português restaurado, o amarelo, prefixo 193. 2007 – Chega a Santos o bonde norte-americano doado pelo Sesc Bertioga. 2008 – No Dia do Bonde, 23 de Setembro, mais um veículo português passa a trafegar pela Linha Turística, após ser totalmente restaurado: o 224, nas cores verde e branco. Neste ano também foi fechado um acordo com a entidade Memória Votorantim para a doação de mais um bonde americano a Santos. 2009 – Em 19 de fevereiro, o acervo do Museu Vivo do Bonde ganhou mais dois presentes, vindos da cidade italiana de Turim: o 3265 e o articulado da série 2800, que funcionará como restaurante. A prefeitura entregará no dia 28 de abril o primeiro trecho de ampliação da linha turística no Centro Histórico. Ao ser completamente concluída, a linha terá 5 km.